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Hoje as palavras que a Serra tem para propor levam-nos até um tempo de trevas e horror. Não não se chama qualquer coisa “em ou de Auschwitz”, mas é para lá que nos transporta, não directamente para as camaras de gás mas para lá perto. Não veiculam nenhuma ideia de humanidade face ao comportamento nazi e já tinham sido escolhidas antes desta infeliz polémica. Hoje recomendo que “Perguntem a Sarah Gross” se quiserem saber algo do horror.

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João Pinto Coelho foi finalista do Prémio Leya com este título em 2014. A obra vencedora, embora boa, é pobre em comparação com esta, mas eu não faço parte do júri… Este livro foi-me apresentado pelo autor no anfiteatro da Escola Básica e Secundária da Quinta da Flores, numa actividade dinamizada pela Biblioteca Escolar. Foi muito bom. Além de excelente na escrita, o autor é um comunicador brilhante. Durante toda a sua exposição o silêncio era audível no anfiteatro cheio de turmas. Toda a gente se sentiu transportada para Oshpitzin primeiro e Auschwitz depois. Ninguém conseguiu ficar indiferente ao mergulho no passado que o autor nos fez dar. Posto isto passemos ao mais importante.

João Pinto Coelho

Perguntem a Sarah Gross

Sinopse

“O meu preambulo são duas páginas que o tempo não descolou. A primeira fala do homem que me fez, que nasceu e se casou pobre; a segunda da sua mulher que tendo nascido rica se tornou pobre quando o aceitou. Querida mãe, que mal te fez aos sonhos teres saboreado o luxo; mas não venha o diabo ao mundo, pois até aos bem-aventurados cumpre, de vez em quando, aprender a baixar as bainhas à vida.

Já eu, não, sempre calcei o número certo.”

Adam Gross, emigrado da Polónia, cria na América um império económico interessante e no espírito do filho uma nostalgia pelas paisagens da sua Oshpitzin mesmo sem este nunca as ter calcado. Esta nostalgia, associada ao caracter de uma mãe dominante e opressiva, leva Henryk, marido da doce Annah e pai da incrivelmente bela Sarah a partir para a Europa em guerra (a primeira). Da Catalunha segue até à Polónia e cinco anos depois de sair de Chicago manda vir a mulher e a filha. As duas adaptam-se estoicamente à vida despida de conforto (americano!!) e a um país em reconstrução. São felizes até à subida de Hitler ao poder na Alemanha. Depois, depois o inferno desce sobre a Terra e a Polónia não é poupada. Sarah e Esther, irmãs para a vida, não de sangue, mas de amor, vão viver horrores. Nos anos sessenta, Sarah é a directora de um dos colégios mais elitistas da América, St Oswald, mas nem os horrores da guerra lhe apagaram a vontade mudar o mundo e por isso vai introduzindo mudanças nesse dinossauro como a admissão de raparigas e de negros. É a partir deste espaço que a teia se desenrola e as diferentes aranhas dão o seu contributo para a densidade da história. A morte extemporânea e violenta de Sarah apressa a transmissão dessa história de horror pela última sobrevivente, Esther. Os ouvidos depositários serão os de Kimberly Parker.

É um livro denso, as personagens são perfeitas nas suas imperfeições humanas. Os sentimentos que carregam são avassaladores, o medo, a vergonha, a arrogância demente, dão a cada uma uma aura de realidade que nos obriga a interagir, a colocarmo-nos no seu lugar e a tomar exactamente as mesmas decisões, a fazer as mesmas escolhas, independentemente do juízo de valor que façamos delas. É um livro duro, todas as personagens carregam fardos pesados, mas mesmo assim ainda há lugar para sorrisos e alegria.

A escrita é feita em vários tempos desde 1923 até 2013. A entrada de cada capítulo, que corresponde a um determinado tempo e a uma determinada personagem, é suficientemente ambígua para que só no final do livro o encadeamento temporal faça completo sentido, sendo surpreendente.

Boa semana com livros!!!

 

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