Considerado por Abel Salazar um dos maiores paisagistas portugueses, imortalizou Penacova ao pintar quadros famosos como “O Vale de Penacova” e “Ferreirinha”. Aqui viveu durante algum tempo, tendo como mecenas Raimunda Martins de Carvalho, provavelmente nos anos em que frequentou a Faculdade de Medicina de Coimbra. Alusivos à nossa terra, pintou muitos outros quadros e, de acordo com uma crónica do pintor Martins da Costa, também na vila terá deixado descendência, um tal Guilherme que teve uma existência fugaz e bastante infeliz.
Eugénio de Oliveira Pinto Moreira nasceu no Porto em 1871. Estudou medicina em Coimbra e naquela cidade, mas não concluiu a formatura nessa área. Ao consultar o “Índice de alunos da Universidade de Coimbra”, de 1537 a 1919, encontramo-lo matriculado em Matemática e Filosofia no ano de 1888, o que se compreende, pois, segundo cremos, os estudantes de Medicina tinham de fazer estudos preparatórios nas Faculdades de Filosofia e Matemática. Nesta cidade conviveu com o grupo “Boémia Nova” (revista de literatura e ciência publicada em 1889)) de que faziam parte nomes como António Nobre, Alberto de Oliveira e Agostinho de Campos. Foi também seu amigo e admirador o poeta Afonso Lopes Vieira. Terá sido também por esta altura que conheceu Penacova, terra a que ficou ligado até 1907 quando partiu para Paris. Refere o Jornal de Penacova (Dezembro de 1907) que chegara a esta vila ”vindo do Porto, este nosso simpático amigo, talentoso artista pintor. Pelo que nos consta, vem desta vez resolvido a abandonar-nos muito brevemente, o que muito nos desgosta.(…) Soube conquistar em cada um dos Penacovenses um amigo verdadeiro.”
Desta ligação e permanência em Penacova ficaram algumas obras, ainda hoje pertença de particulares, como é o caso de um quadro que representa o Bico da Lapa, datado de 1906. Pintou ainda “Penacova-vista do rio Mondego”, obra que esteve exposta na Sociedade de Belas Artes em 1905. Já em 1902, na 2ª Exposição daquela Sociedade, havia estado patente, além da “Ferreirinha”, “Vale da Ribeira de Penacova” e “Luar no Mondego-Penacova”. Há também notícia de ter pintado um retrato de Artur Leitão que foi colocado na sala de sessões da Câmara em 1907. Nos seus escritos Martins da Costa referiu que tinha passado pelo seu atelier o restauro de um retrato de alguém importante, mas que não soubera identificar. Provavelmente terá sido este trabalho de Eugénio Moreira. Outras se perderam ao longo dos anos, como aconteceu com as que eram pertença de Raimunda Martins de Carvalho e que não foi possível salvar num incêndio ocorrido na Casa do Repouso. As fotografias de dois desses quadros estiveram expostas no Porto, em 1956, a par de cerca de 35 quadros deste pintor. “Uma exposição de arte onde muito se falou de Penacova”, de acordo com o artigo de Oliveira Cabral publicado no Notícias de Penacova. O primeiro quadro que figurava no catálogo desta exposição era precisamente “O Vale de Penacova” (provavelmente pintado enquanto estudante de Medicina em Coimbra) e, em segundo lugar, um quadro intitulado “Rapariga de Penacova”. Não confundir com a célebre “Ferreirinha” pois já nesta altura não se sabia qual o paradeiro do original, pensando-se que teria sido levado para os Estados Unidos da América.
“O Vale de Penacova” mereceu a publicação, em 1948, de um trabalho de Abel Salazar (1889-1946), onde este médico, professor e pintor destaca Eugénio Moreira como expoente máximo da pintura paisagística portuguesa. Merece a pena ler um excerto: “A sua objectividade [da pintura “O Vale de Penacova”] funde, desaparece, quando o olhar a procura (…) tem um rigor matemático que surpreende, e no entanto, tudo se funde em aérea sinfonia de luz e de tons, tudo flui, muda, se transforma, tudo é apenas momento que agoniza, na luz, nos casarios e nos montados.” De igual modo a “Ferreirinha” mereceu grandes análises de críticos de arte. Poderíamos referir a obra “Jornadas em Portugal”, onde Antero de Figueiredo dedica um extenso capítulo a Penacova. E fá-lo evocando, curiosamente, Eugénio Moreira. E deste pintor disse o seguinte: “Eugénio Moreira amava o que via. Mas não se cingia à seca regra naturalista: pintar só o que vê. A sua fórmula era mais transportada: pintar o que se não vê no que se vê, que é como quem diz, pintar com olhar culto para saber o que se deve ver, ou com o instinto penetrante para adivinhar o que se deve amar”. Esta análise aplica-se também, e em grande parte, às obras icónicas que deixou sobre Penacova, desde o “O Vale de Penacova” à “Ferreirinha” e a outros trabalhos onde as paisagens e as gentes de Penacova estão presentes. Recordou Oliveira Cabral que “a permanência aturada do pintor ilustre em Penacova” se devia “à Ex.ma Srª D. Raimunda de Carvalho”, que como sabemos acarinhava e acolhia nomes do mundo das artes, fossem musicais, fossem plásticas, como foi o caso de José Campas, outro pintor que nos legou excelentes quadros sobre Penacova.
Depois de abandonar Medicina, frequentou a Academia Portuense de Belas Artes. Partiu depois para Paris, onde foi discípulo de Jean-Paul Laurens e de Benjamin Constant, recebendo influências dos movimentos impressionista, fauvista e Nabis.
Depois de regressar a Portugal ainda estudou paisagem e figuras portuguesas.
Este “insigne pintor” que, na opinião de Oliveira Cabral, bem merecia ter o seu nome na toponímia da vila, morreu em 1913, aos 42 anos, vitimado pela doença.
David Gonçalves de Almeida