Nesta minha crónica de hoje e possivelmente na próxima crónica, vou apresentar-vos o testemunho de Herminie Louise Roth – Para uma Velhice de Qualidade.
Em 1986, Herminie Louise Roth, uma senhora suíça encontrava-se com os seus 100 anos, cheia de vigor e com autonomia física. Senhora culta, que fora professora e secretária em países de vários continentes e que dirigira a instituição de convalescença “ Vie et Santé”, na Argélia, durante 7 anos, apresenta-nos o seu testemunho, resultante de observações que fez numa Estrutura Residencial para Idosos, na Suíça. Esta Senhora fala de coisas simples mas importantíssimas para uma Velhice de Qualidade e que passo a citar:
“ Não tenho segredo algum de longevidade. Mas tenho uma linha de vida, um estilo de vida. A vida permitiu-me conhecer muitos meios e as mais variadas espécies de situações.
Desde a minha primeira infância, meus pais fizeram-me participar na vida corrente. Desde que fui capaz de escrever, pediram-me para escrever os endereços numa vintena de revistas “ Sinais do Tempos”, que o avô Roth expedia cada mês. O papel não tinha linhas, e era necessário escrever direito sem erros. Aos sete anos, meu pai confiava-me um grande porta-moedas castanho que continha dinheiro e pedia-me para ir levá-lo ao banco, que ficava do outro lado da rua, um pouco mais abaixo. Meu pai vigiava-me da janela, para se certificar de que eu seguia as suas recomendações. Aos doze anos, minha mãe pedia-me de vez em quando que preparasse o pequeno-almoço para a família.
Além da bebida era necessário cozinhar um cereal, pôr a mesa e ter tudo a horas. Esta espécie de educação deu-me o gosto pelo esforço, por tarefas difíceis, e ajudou-me a compreender o sentido da responsabilidade.
Portanto, dito isto, uma velhice de qualidade não é um presente. É preparada com muito tempo de antecedência. A velhice de qualidade não é apenas um período de vida, é também uma dimensão de vida. É o resultado de uma convicção e do esforço de vontade. É um estado de espírito. E também uma transposição, uma sublimação dos interesses materiais para os valores morais, espirituais e eternos.
O irreparável ultraje dos anos continuará a ser sempre uma fonte de sofrimento. Sem uma atitude positiva do espírito, sem uma disciplina mental e espiritual, a velhice pode ser desmoronamento, uma tragédia. E para que isso não aconteça, deixo alguns elementos que podem ajudar a desenvolver uma velhice de qualidade, a saber:
Contra a concentração em si próprio
Aceitar com contentamento o que não se pode mudar nem evitar. Não ruminar as suas preocupações, as suas dores, as suas decepções, as suas infelicidades.
Adaptar-se com maleabilidade e rapidez às circunstâncias, ao meio;
Evitar a doença de análise que esteriliza toda a actividade;
Não pensar que se deve intervir em todas as conversações;
Não falar demais;
Saber ouvir os outros sem interromper;
Não carregar os seus discursos com pormenores inúteis, que fatigam e irritam os outros;
Não dizer tudo o que se sabe, mas saber tudo o que se diz;
Fugir da contradição sistemática: é uma arma de dois gumes;
Respeitar as opiniões dos outros. Não ter ideias fixas;
O declínio das forças e da actividade pode fazer surgir uma necessidade de se valorizar; evitar falar de si ou de relacionar tudo a si;
Não ser invasor, não se intrometer nos assuntos dos outros;
O velho egoísta que quer que os outros o sirvam priva-se de muitas alegrias.
Em contacto com os outros
Não ser curioso. Para quê querer saber tudo, ver tudo, ouvir tudo? Para quê? Dominar a língua. A crítica, a maledicência, a calúnia afectam também a saúde do corpo;
Ver e contemplar o bem, o bom e o belo;
Não ser avarento ao ponto de privar-se das coisas úteis;
Não suspeitar que os parentes aguardem a vossa partida para terem o que vos pertence;
Dominar o apetite. Parar de comer quando se tem ainda um pouco de fome. O domínio do apetite desempenha um papel de primeiro plano para a compreensão das coisas espirituais e para a formação de um caracter cristão;
Não se gastar, ao tratar com as pessoas;
Modelar a voz. Uma palavra mansa pode tornar-se dura devido ao tom com que é proferida;
Disfrutar de passatempos que não dependem dos outros;
Vigiar as reacções do coração e da idade, para lhes dar uma dimensão conveniente, razoável. Evitar os excessos emotivos, afectivos, nervosos. Evitar também o desperdício de sensibilidade;
Conservar o domínio próprio até no modo de se apresentar e vestir.”
Estas são algumas dicas para uma velhice de qualidade na perspectiva de Herminie Louise Roth já falecida e que nos ajudam à reflexão, no sentido de todos nós que envelhecemos, termos a possibilidade de fazer opções para viver melhor nesta etapa da vida.
Como o testemunho de Herminie Louise Roth é longo, continuarei na próxima crónica com o mesmo tema “Para uma Velhice de Qualidade .”
Termino esta crónica com um pensamento de Hermann Melville que diz: “ Saber envelhecer é a obra-prima da sabedoria e um dos capítulos mais difíceis na grande arte de viver.”
Rosário Pimentel