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O que tem o Padre Américo a ver com Penacova? Tem, mais precisamente com S. Pedro de Alva. Foi aí que a “Obra da Rua” começou a ser pensada. Em declarações à revista “Os Nossos Filhos” (1944) é o próprio fundador das Casas do Gaiato que o recorda: “Parece que fora pregar a S. Pedro de Alva, mas não: fui cimentar as bases do que depois se chamou e hoje é, Colónias de Campo do Garoto da Baixa. A ideia já não cabia na estreita casa de S. Pedro de Alva (…) Nem a ideia nem os rapazes cabiam na casa primitiva, onde nasceram os dentes da obra.”

Antes de registar algumas notas biográficas do padre Américo, citemos um pouco mais da referida reportagem:

Calhou ir a São Pedro de Alva por aquele tempo pregar na Igreja do povo ao povo. O Prior da Freguesia quer que eu vá mais ele visitar o edifício onde instalara uma escola nocturna. Era uma sala rasgada, com dependências anexas. Das amplas salas via-se pousar o céu na Serra do Caramulo e na Estrela gigante. Olhei as quebradas dos montes, mai-los campos em redor. Indaguei distâncias de água, índole do povo, facilidades de pão; e debrucei-me no peitoril da janela, a olhar…Vi o Beco do Moreno, a cama do artista doente, os quatro filhos sem pão. Não sei que me deu no peito, que o prior quis saber o que eu tinha! (…) Fiz uma descoberta no Beco-do-Moreno, disse: quero realizar aqui o meu pensamento, revelei. Ele disse-me que sim.”

Passou-se isto em Maio de 1935 e logo em Agosto “trinta catraios do tugúrio, fizeram ali um estágio de trinta dias, todos de vinte e cinco horas (…) “, com o apoio do Pároco, Padre José Augusto Ferreira Simões e Sousa, do Cónego Manuel Fernandes Nogueira que lhe deu cem escudos e do Bispo de Coimbra, D. Manuel Luís Coelho da Silva, sendo acompanhados por seminaristas e estudantes universitários.

Falava-se em S. Pedro de Alva na colónia aventura. O dedicado prior da freguesia preparou as coisas. O Dr. Coimbra, mandou fazer catres, mesas e mochos na fábrica da Estrela de Alva. O farmacêutico [que seria Eduardo Pedro da Silva, velho republicano] dizia aos amigos da botica: que pena ser isto obra de um padre!

No segundo ano da Colónia a recepção foi ainda melhor: “A plateia, que duvidava do sucesso do ano anterior, começa agora a dar palmas e a dizer que sim; e já não tem medo que os garotos da rua assaltem as quintas (…) Aparecem donativos e palavras de encorajamento.”

A velha “Casa da Colónia”, na rua da Palmeira, existiu até há pouco tempo. Acabou por ruir em Dezembro de 2017 e ser, lamentavelmente, arrasada. Uma antiga lápide recordava que por ali passara o padre Américo, quando de 1935 a 1939 ali funcionou a “Colónia de Férias de Campo”.

Américo Monteiro de Aguiar nasceu a 23 de Outubro de 1887 na freguesia do Salvador de Galegos, concelho de Penafiel, filho de Ramiro Monteiro de Aguiar e de Teresa Ferreira Rodrigues.

Após ter concluído os estudos primários em Penafiel  e em Felgueiras, enveredou pela carreira comercial, primeiramente no Porto, e a partir de 1906, em Moçambique.

Aos 36 anos, movido pelo persistente e antigo desejo de ser padre, regressou  a Portugal e foi frequentar o Convento Franciscano de Tui, Espanha, onde fez o  primeiro ano do Noviciado. Interrompeu este percurso e pediu admissão ao Seminário do Porto. Foi recusada a entrada,  em virtude da sua idade. No entanto, em 1925, o Seminário de Coimbra abriu-lhe as portas.

É aí, e logo desde o início dos seus estudos teológicos, que começa a revelar as suas capacidades discursivas e de reflexão, escrevendo para a Lume Novo, revista dos alunos daquele Seminário, e logo desde o seu primeiro número (1926), sob o pseudónimo de Frei Junípero.

Três anos mais tarde recebe a Ordenação Sacerdotal (28 de julho de 1929) e, após uma breve experiência como formador e prefeito naquele Seminário, encarrega-se da “Sopa dos Pobres”, em Coimbra, passando a dedicar-se em exclusivo ao apostolado da Caridade nos tugúrios de famílias em dificuldades daquela cidade.

De 1935 a 1939 organiza Colónias de Campo em S. Pedro de Alva, Ceira e Miranda do Corvo, período em que ganha forma o seu sonho da criação do que viriam a ser as Casas do Gaiato.

A primeira Casa foi fundada em Miranda do Corvo (1940), seguindo-lhe Paço de Sousa (1943), Tojal (1948), Paredes (1954) e  Setúbal (1955). Em Paredes  nasceu o “Calvário”, espaço para acolhimento de doentes incuráveis, deficientes profundos e abandonados.

A 5 de março de 1944 funda o jornal “O Gaiato”. Cria os “Lares” de “rapazes trabalhadores” no Porto (1945), Coimbra (1946), Lisboa e Setúbal. Em 1941, já tinha criado, em Coimbra, o “Lar do Ex-pupilo das Tutorias e Reformatórios do País.

Viaja ao Brasil (1949) e a África (1952), levando na bagagem a sua experiência e proposta de resolução do problema dos jovens abandonados; em 1951 tinha já lançado os alicerces das primeiras casas do “Património dos Pobres”.

Morreu no Hospital Geral de Santo António, no Porto, a 16 de julho de 1956 em consequência dum desastre de automóvel em S. Martinho do Campo, Valongo, no regresso duma viagem ao sul do País.

Foi exumado a 15 de Julho de 1961, no cemitério paroquial de Paço de Sousa, e trasladado no dia 17 para a Capela da Casa do Gaiato de Paço de Sousa, onde jaz em campa rasa, como fora seu desejo.

David Gonçalves de Almeida

 

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