Depois dos livro “As Tartarugas também Choram” e “Burro Carga-d’água, do projeto Estórias do Meu País Inventado, surge um novo livro intitulado “Katxor de Rua”, o primeiro com edição simultânea em Portugal e Cabo Verde.
Com textos de João Fonseca e ilustrações de ilustrações Yuran Henrique, o livro “Katxor de Rua”, publicado pela Editorial Novembro, conta a estória de uma cidade onde os meninos de rua têm medo do escuro e da solidão. Sem eira nem beira as crianças daquela cidade são o rosto da agonia que habita os corpos flagelados de uma humanidade fracassada.
A apresentação do livro, agendada para próximo dia 10 de setembro, na Bibilioteca Municipal de Penacova, ficará a cargo da Anabela Bragança e será lido por Maria Luísa Seabra Azevedo.
Sobre o projeto Estórias do Meu País Inventado
João Fonseca é um português, casado como uma penacovense, que vive em Cabo Verde e que decidiu contar ao filho a história deste país, escolhendo a tartaruga como embaixadora de uma diplomacia criativa que inclui um livro, um mural e muitas horas de leitura.
A literatura que se fazia sobre Cabo Verde para as crianças estava muito centrada nos modelos ocidentais, principalmente no modelo europeu, e procurei uma nova roupagem para que o meu filho, que nasceu aqui, possa compreender no futuro o país onde nasceu e viveu”, contou à agência Lusa.
O propósito era elaborar uma história, com que todos os anos presenteia o filho no aniversário, mas acabou por ser um projeto de literatura infantil que já levou à estampa um dos cinco livros projetados sobre a realidade do país nas vertentes económica, política, social e cultural.
O projeto, intitulado “Estórias do meu país inventado“, tem uma prioridade que é “focar em pontos estruturais na sociedade: cultura, pobreza, modos de vida, ambiente”.
“São cinco livros e todos eles focam numa particularidade da realidade cabo-verdiana”, disse.
O objetivo, explicou, é “chegar ao fim dos cinco livros e ter um retrato social do país, mas ao mesmo tempo que esse retrato social seja um sinal de esperança para construir uma sociedade no caminho da evolução e mais bonita”.
O primeiro livro – “As tartarugas também choram” – foi uma “tentativa de abordagem do contexto económico e social e de falar da questão da biodiversidade e das tartarugas”. O segundo, a lançar no final deste ano, “fala da realidade das ilhas no interior e da agricultura e das pessoas que vivem isoladas, sem água, sem luz e das crianças que por vezes não frequentam a escola”.
Com 32 anos e professor na cidade da Praia, João Fonseca chegou a Cabo Verde há cinco anos e meio. Viveu no Mindelo, ilha de São Vicente, e passou pelo interior de Santiago, antes de chegar à capital.
Pelo meio, rendeu-se aos dotes artísticos e humanos da comunidade dos Rabelados de Espinho Branco, no interior de Santiago, onde existe a Aldeia RabelArte e vivem artistas como Sabino Gomes Horta que ilustrou a história de João Fonseca e, recentemente, pintou um mural em Achada de Grande de Frente, na Praia.
“Este projeto tem uma característica muito especial que é o facto de as histórias serem ilustradas pelos Rebelados, que são artistas que vivem isolados, também eles com muitas carências económicas e sociais, que nunca tiveram formação, são analfabetos, e estão a fazer este trabalho de ilustração, sendo a primeira vez que alguém trabalha com eles ao nível da literatura”, contou.
João Fonseca pretende “afirmar os Rebelados no panorama da arte em Cabo Verde, porque são completamente desvalorizados – só são valorizados pelos estrangeiros, e ajudar na sua difusão em todas as ilhas e não só em Santiago”.
Para já, e por iniciativa do escritor, os artistas estão a ser ajudados ao serem pagos pelas pinturas assim que as fazem e sem esperar pelos direitos de autor provenientes da venda dos livros, que é sempre pouca em Cabo Verde.
São mais os propósitos das “Estórias do meu país inventado”, nomeadamente fazer com que “a atividade que tem desenvolvido de ir às escolas, apresentar os livros às crianças e realizar atividades para as crianças, sem qualquer apoio, seja também impulsionadora para outros projetos e que a literatura cabo-verdiana se foque na realidade cabo-verdiana e se abandone a cultura ocidental, europeia”.
Sobre a reação das centenas de crianças que têm recebido a visita de “As tartarugas também choram” e do contador de histórias Valdir Brito, o autor classifica-a de “muito positiva”.
“Nota-se que é preciso desenvolver um trabalho pedagógico no âmbito da biodiversidade e da preservação da natureza, do mar e da tartaruga. Não é um assunto que esteja explorado e resolvido”, disse.
O nosso lema principal, explicou, “é que, como nem todas as crianças têm acesso ao livro, deve ser socializado, caso contrário o livro não tem influencia, não serve para nada e nós fizemos esse trabalho de socialização: em vez de vendermos o livro, fomos mostrar o livro e contar o livro às crianças”.
O tema das tartarugas não é indiferente às crianças cabo-verdianas que se identificam muito com esta questão.