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Hoje as palavras a saírem da Serra nasceram no sonho do João Fonseca.

O Universo, ou o destino ou aquilo que se quiser, meditou sobre este jovem e considerou que ficava muito bem por Penacova. Assim foi. O Cupido, esse anjo travesso, apontou uma seta aos corações da Inês e do João e pumba!!! O João ficou caidinho por ela. Mas ela não ia só, levava esta terra de penedias e serras atrás. E o João ficou dos nossos. 

O destino, sempre esse maroto, encaminhou estes jovens mar adentro (assim seria se fossem de barco, como nos passados) até Cabo Verde. É aí que o Tempo concede ao João tempo para se dedicar ao projecto que hoje vos deixo. 

Este projecto, nascido da alma terna do João, é essencialmente um projecto de memória. Procura que os mais frágeis entre os frágeis não sejam esquecidos. Lembra-nos que existem crianças a quem não é dada oportunidade de o serem e de se construírem, existem animais que a desumanidade votou ao extermínio, existe um Mundo que é feito de muitos mundos e que o respeito por todos eles é garantia de variabilidade que pode significar um pouco mais para todos. A obra total compreende cinco livros. Três já estão disponíveis. Ficaremos a aguardar pelos próximos dois.

Hoje deixo mais do que uns livros, hoje deixo um casamento entre literatura e pintura/ilustração, com se dentro de cada livro os mundos fossem ampliados, o da escrita pelo pincel e o do desenho pela caneta.

As ilustrações permitem que as crianças não leitoras de palavras possam construir as histórias que queiram, serão apenas o mote para estimular a criatividade. Para as crianças a quem a palavra escrita já tenha sido devidamente apresentada a obra do João poderá ser um grito de alerta e um flash de memória para o futuro.

Em qualquer caso atrevo-me a dizer que os livros do João não são “livros para crianças” mas sim “livros de crianças”. As assimetrias são gritantes, tanto dentro das ilhas como comparando com o  universo continental, mas a capacidade de sonhar está em todas, nas ricas, nas remediadas e nas pobres com o mesmo fervor. Para hoje recomendo três livros, As Tartarugas Também Choram, Burro Carga-d’água e Katxor de Rua. O ultimo titulo será apresentado ao publico na próxima sexta feira , aqui na nossa Terra. 

Em comum existe a personagem animal, sempre um que sente na pele os aguilhões da desumanidade, e as crianças  carregadas de sonhos ou de desilusões.

João Fonseca

As Tartarugas Também Choram

“Era uma vez uma terra com casas grandes e casas pequenas. As casas grandes tinham jardins de sonho e piscinas de paraíso. Eram casas com muita luz e muita comida. (…) As casas pequenas eram casas quase sem salas e sem quartos. Com pouca luz e pouca fartura.”

“Os homens maus mataram as tartarugas velhas e mataram os ovos que tinham as tartarugas novas.”

Sinopse

Numa terra-país há praias de areia branca e outras de areia preta, casas grandes e fartas de felicidade e casa pequenas fartas de miséria. Meninos bons e felizes e meninos bons menos felizes, todos ricos em sonhos. Há também homens bons e homens maus.

As tartarugas velhas fazem um esfroço tremendo para virem depositar os seus ovos nas parais de areia branca, homens maus aguardam por elas levando-as ao extermínio. 

Este mundo de opostos, um dia une-se para salvar as tartarugas, afinal elas também choram…

Burro Carga-D’água

 

“- Lá longe, até onde os nossos olhos alcançam é o nosso mundo. Isidora com medo de que os irmãos não a percebessem , acrescentou:

-Param além do longe é o resto do mundo. É tão grande que ninguém sabe onde acaba.”

“Isidora, que aprendera com as palavras os lugares da Terra e os nomes do mundo, quando olhava para os irmãos carga-d’água lembrava-se que todos eles cresceram a sonhar com um outro amanhã. 

Todos os dias de lembrava das palavras dos irmãos carga-d’água: Na montanha mulher nova vira mulher velha.” 

Sinopse

O nome do burro reflecte a sua profissão. Todos os dias o burro e os irmãos Josélino e Hipolito descem da sua aldeia, nas encostas da montanha, para buscar na ribeira a água que  não têm. O seu mundo é curto, fechado pela linha do horizonte, e isso é o mundo todo. A irmã, isidora, teve a sorte de conhecer as palavras e com esse conhecimento descobriu que o horizonte pode ser sempre mais longe. Na aldeia os confortos do progresso esqueceram-se de subir a encosta, por isso o tempo é ditado pelo Sol e pela Lua. A labuta diária depressa apaga sonhos de futuro que viviam nos olhos das crianças, envelhecendo infâncias que nunca chegaram a crescer. 

Katxor de Rua

 

“Naquela terra havia uma cidade onde os meninos de rua tinham medo do escuro e da solidão.

Sem eira nem beira, os meninos de rua erguiam palácios invisíveis nas principais praças da cidade. Acendidas as estrelas e vencido o medo, adormeciam no aconchego do vento e na ternura da lua. Assim era todas as noites.”

Sinopse 

Numa terra- cidade os meninos de rua têm. Têm fome. Têm medo. Têm frio. Têm desespero. Mas também têm sonhos … estes meninos cedo descobrem que têm de arranjar formas de sobreviver, ou de mão estendida esperando esmola que pode não chegar, ou trabalhando em labutas que os seus fracos corpos ainda não deveriam conhecer. Neste universo de dor, com pouco riso e muitas lágrimas, há um menino a quem a rua não matou a capacidade de sonhar, é o Maré Alta. Este menino embala a solidão dos outros com histórias que vai deixando sair da sua capacidade de sonhar. Um dia encontra um cachorro, Katxor, meio morto de fome e desalento sobre os restos de um livro. É seduzido pelo cão e pelo livro que vai ler aos outros meninos. Ficam tão entusiasmados com a forças das palavras que antes não conheciam que passam a esmolar livros em vez de pão. Mas em cada esquina o mal espreita e o Katxor vai ser apanhado pela malha assassina do carro da morte. A alma de Maré Alta morre com ele, as histórias acabam e os meninos voltam ao negrume das noites sem aconchego.

Boa semana com livros!!!

Anabela Bragança

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