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E se o Estado é relapso

E se furta à legalidade

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Promove, assim, o colapso

Da democraticidade

 

Não transpõe as directivas

Viola os seus deveres

Nem mesmo com invectivas

Cumpre os seus quefazeres!

 

Portugal deveria ter transposto para o seu ordenamento jurídico, até 25 de Dezembro do ano findo,  a Directiva n.º 2020/1828, de 25 de Novembro, que disciplina o regime das acções colectivas transfronteiriças como meio de tutela dos direitos em massa dos consumidores. Da sua dimensão transindividual. E não o fez.

Uma vez mais, o Estado português age com um ente relapso no cumprimento das obrigações impostas pelos Tratados da União Europeia.

Uma vez mais os prejuízos decorrentes do facto são manifestos para a categoria de cidadãos aí englobada.

Tem sido essa,  sistematicamente, a prática.

Para citar só dois ou três casos, assim aconteceu com o regime das práticas comerciais desleais (que deveria ter entrado em vigor a 12 de Junho de 2007 e só entrou a 1 de Abril de 2008), com o dos serviços financeiros à distância ( 09 de Outubro de 2004 a 29 de Junho de 2006), com o primitivo normativo das garantias dos bens de consumo (de 01 de Janeiro de 2002 a 09 de Abril de 2003, no geral, que para as garantias contratuais o prazo foi ainda mais dilatado) em que por inconsideração, descaso, negligência do Estado português, interesses e direitos dos consumidores foram ‘mandados às urtigas’. Com as consequências daí emergentes.

Para nos referirmos só ao diploma legal das garantias dos bens de consumo, os consumidores que adquiriram, em Portugal, veículos automóveis, entre 1 de Janeiro de 2002 e 08 de Abril de 2003, perderam 1 ano de garantia. Nada mais, nada menos que 1 (um) ano… Deveriam ter dois (2) anos de garantia e só lhes foi dado um (1), de harmonia com a lei que vigorava ao tempo (a Lei-Quadro de Defesa do Consumidor de 31 de Julho de 1996).

Claro que os consumidores poderiam voltar-se contra o Estado mercê do efeito directo das directivas. Mas quem conhece tal instituto, quem domina tais mecanismos? Quem os usou em seu favor? Quantos o fizeram? Nenhum, que se saiba, por ignorância como por inoperância das associações de consumidores, como ainda pelas dificuldades e dispêndios que resultariam para o desencadeamento das iniciativas processuais tendentes à consecução da tutela singular ou colectiva dos direitos destarte afrontados.

O Estado espezinha os direitos dos consumidores. E isso constitui um péssimo proceder para entidade que se reclama de Estado de Direito Democrático, que não pode proceder contra legem (contra a lei), praeter legem (para além da lei), mas secundum legis (segundo a lei).

O Estado exige que os cidadãos cumpram a lei, mas o Estado não a cumpre perante os cidadãos, não cumpre para com os consumidores.

Algo que representa uma quebra imensa de autoridade e suscita um permanente conflito entre a sociedade e o Estado em detrimento dos cidadãos e em benefício, afinal, dos sujeitos de direito ou do universo alvo a que tais comandos normativos se dirigem, normalmente os operadores económicos em contacto com os consumidores nos diferentes segmentos de mercado.

Parece, em circunstâncias tais, que o Estado não está ao serviço da comunidade, mas de interesses escusos ou obscuros que tendem a minar as relações entretecidas entre fornecedores e consumidores.

Para além de situações como as que se denunciam, outras há que nos deixam perplexos, como a que se prende com a Comissão das Cláusulas Abusivas: ano e meio depois da data-limite para a sua regulamentação, “nem novas nem mandados”… Nem foi estruturada e menos ainda, em resultado, instalada, o que preclui a entrada em vigor da lei do Parlamento (Lei 32/2021, de 27 de Maio) cuja vigência se apontara para 25 de Agosto de 2021 e se acha prejudicada pela omissão decorrente de uma efectiva existência da Comissão, que não saiu do papel.

E não há quem se indigne com isto?

E o Parlamento omite a sua fiscalização ao Governo, às suas próprias omissões?

E os partidos não se encrespam contra estas vergonhas que põem em causa a autoridade do Estado? Do Estado que age violentamente contra quem “assalta” um parquímetro e dele retira 3 euros ou quem faz ‘mão baixa’ a uma lata de sangacho num supermercado popularucho, mas deixa passar em branco os descarados “roubos” de quem toma literalmente de assalto autarquias, institutos, serviços com a insígnia do próprio Estado?

Que responda quem souber…

Mário Frota

presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO – Portugal

 

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