Pedro Viseu
Não muito longe vão os tempos de abundância daquela que, até há pouco, foi aclamada a rainha da nossa gastronomia, tal era a vontade com que muitos (às centenas) se deslocavam a Penacova para degustar aquilo que consideravam uma verdadeira iguaria, que só se podia verdadeiramente apreciar durante os meses de fevereiro e março, não sendo, por isso, um acaso que lhe fosse dedicado um fim de semana total, até se transformar num festival. Com ele surgiu a inevitável confraria e os habituais intercâmbios capitulares que enchiam, e ainda enchem, de cor, alegria e algumas epifanias, as ruas da nossa vila e oferecem aos confrades todo um manancial de coisas comestíveis, doces e boas, típicas da nossa região, cuidadosamente elaboradas para bem receber e muito dignas do prazer confrádico.
Mas essa abundância, que até aqui permitiu a concretização de todas essas sinergias, em minha opinião, pouco mais irá durar, não só porque se acabaram as chuvas amigas que traziam as cheias ao Mondego e com elas a desova da lampreia que por ele subia, mas também por (principal) culpa dos humanos, que desenfreada e inconsequentemente, insistem em moldar o que é natural à sua imagem, transformando os rios em canais e, claro, devido às alterações climáticas que, neste caso, têm particular influência.
Está, assim, instalada a carência das condições ideais para que tal ciclóstomo (ou agnato), consiga atingir o ponto ótimo de consumo, ditando o seu (quase) desaparecimento, seja do rio, seja dos pratos e transformando-o num raro manjar só acessível à bolsa de alguns que persistem em manter viva a vontade de o comer, independente do custo.
Perante este cenário, será legítimo concluir que a lampreia morreu, não que se coma viva, como é óbvio, mas como produto que possa ter honras de um festival através do qual, por norma, se pretendem atrair centenas de pessoas.
Desse modo, creio que estamos perante um verdadeiro problema. Se a escassez de lampreia de mantiver, não vejo de que forma é que o nosso município pretende atrair os comensais para as mesas dos nossos restaurantes, com o pretexto de lhes proporcionar um fim de semana de lampreia a preços baixos, se ela quase não existe. Terá assim os dias contados, um dos maiores cartões de visita do nosso concelho, cabendo aos responsáveis pelo nosso município, e pela nossa restauração, encontrar algo que a substitua, sob pena de se tornar num prejuízo, em vez de, como seria de esperar, significar uma oportunidade para dinamizar o já de si débil tecido económico do nosso concelho.
A solução poderia passar por se associarem às iniciativas de outros municípios que, não tendo no rio a sua maior inspiração, comungam das mesmas tradições gastronómicas, como é o caso dos municípios que integram as Terras da Chanfana, e que se unem à volta de um prato que também nos é tão familiar, diria até mais que lampreia, ou não fossem as gentes do nosso concelho as mais sacrificadas com as invasões francesas e, por isso mesmo, mais necessitadas de assegurar o seu sustento perante as investidas do esfomeado invasor.
Caro Pedro; Caros Leitores do PenacovaActual
A análise feita neste artigo de Opinião e as suas Conclusões, não anda longe da ideia que eu próprio tenho, algumas vezes expressa neste nosso Jornal.
Penso, todavia, ser importante acrescentar, caso não leves a mal:
– a Confraria da Lampreia está, praticamente parada e, os membros da sua Direção nem percebem de “direção”, nem se lembraram durante estes últimos tempos de uma vertente importante da Confraria, qual seja a sua vertente ambientalista, em defesa do produto, o que foi feito com êxito na solução das “escadas de peixe; do impedimento da construção da Mini-Hidrica; na oposição severa ao desassoreamento das areias do Parque da Cidade, em Coimbra.
– também não se ouve qualquer alusão a uma situação anómala que identifiquei há muito tempo, como seja a circulação muitas vezes clandestina de lampreia estrangeira, cuja condição de salubridade se desconhece.
– e, tanto quanto se percebeu recentemente, a Confraria esteve alheada do Festival da Lampreia.
! Isto para não falar de ter por sua conta uma Escola como sede, sem nada fazer para a reabilitação prometida há 4 anos, imagine-se, num contexto em que MUITAS outras Associações do Concelho não têm nada !
O produto Lampreia já não existe (ou não chega) em Penacova há uns anos…
Foi afastado pelas atrocidades da construção dos Açudes.
E está a sofrer da machadada das alterações climáticas.
Se bem verificarmos, ressalvando a Restauração que continua a beneficiar do produto, ainda que imigrante, a VERDADE é que acabaram os seus Pescadores na nossa região.
Como dar a volta a um texto tão complexo, que retirará protagonismo a algumas personalidades é a questão que se coloca à nossa terra, mas que exige desprendimento e não dependências bacocas.
Parabéns