Publicidade

David Gonçalves de Almeida

Antero de Figueiredo (Coimbra, 28 de novembro de 1866 — Porto, 10 de abril de 1953) foi um escritor português.

Nem todas as terras deste nosso Portugal se poderão orgulhar de ver o seu nome gravado nas páginas de ouro da Literatura Portuguesa, em especial da Literatura de Viagens. Penacova faz parte de um conjunto de terras que, pelas suas belezas naturais, tocam a sensibilidade artística de escritores, de poetas e de pintores.

Muitas dessas referências a Penacova serão já conhecidas de muitos dos nossos leitores. Os excertos que de seguida transcrevemos têm a assinatura de Antero de Figueiredo (1866-1953) e foram retirados de uma das suas obras intitulada Jornadas em Portugal. Neste livro publicado em 1918, o autor, nascido na vizinha Lourosa e estudante de Coimbra, dedica inteiramente a Penacova um dos dezassete capítulos.

Publicidade

A Penacova de Antero não é a mesma Penacova de hoje. Aqui a natureza ainda “vive”, mas a vegetação autóctone e desafogada, as encostas salpicadas de “pinho” e de olivedos, as terras amanhadas, a nudez telúrica da “penedia”, deram lugar à omnipresença sufocante das silvas, dos eucaliptos e das mimosas, abafando, em grande medida, o rio e as suas margens.  Apesar de tudo isso, a Penacova de hoje mantém a essência primordial que lhe foi dada pelas forças da natureza, que permanece nos montes e nos vales e nos muitos recantos que sobreviveram à mudança ou onde o efeito da mão humana, malgrado uma ou outra intervenção menos feliz, lhes acrescentou mais valor, mais beleza, mais atractividade.

 Do livro de Antero de Figueiredo, Jornadas em Portugal:

[…] Cogitava nestas coisas enquanto o automóvel, que me levava, fugia pela estrada de Coimbra a Penacova, – bela entre as mais belas, sugestiva entre as mais sugestivas – a acompanhar as curvas do Mondego, marginado, de cá, de outeiros socalcados de campos e de parques; de lá, de montes, uns brandos, cobertos de pinhais novos e verdinhos, ou de velhos pinhais de copas espessas; outros,  de penedias violentas da idade das convulsões. A estrada volta-se e revolteia-se como cobra perseguida. Às  vezes, numa curva decidida para um lanço recto e longo, de costas para o rio, ela parece querer fugir, emancipar-se de tanto enlevo; mas logo, noutra curva vencida, em sentido contrário, lá se torna, chamada pelo encantamento do Mondego – pela sedução das suas margens permanentemente insinuantes na sua variedade feita de bosquetes tenros, de florestas duras, de hortas fartas, de trigais amarelinhos, de penedias agrestes, de laranjais perfumados, – de panoramas de surpresa maravilhadora.

E assim todo o tempo, até que se avista num alto, num promontório, em fundo de pinhais e de penhascos violáceos e amarelos, sobre o areal largo do Mondego, o casario branco e acastelado da alcandorada Penacova.

 […]

Que extraordinário assunto para pintar que não é este vale de Penacova, visto do Penedo do Castro, da Carvoeira, da Senhora do Monte Alto; vasto, luminoso, colorido, com seu rio, campos, montes e serras ; ou, mais simples e ameno, visto da Senhora da Guia, capelinha no alto de um cone de verduras de árvores e de socalcos de campos, sobre farta várzea de milheirais de ouro e olivedos de cinzas prateadas, que vão, uns e outros, longe, até às colinas de lá , onde, a meia encosta, pousa o lugar da Carvoeira — manchas de casais brancos, esparsos entre verdes postos na tinta estamenha dos montes nus que, por esse lado, confinam a paisagem.

De cá, nos longes, – pinhais de alto a baixo; próximo, – cumiadas com pinheiros ralos a escalarem lombas de margaças lilases, que a luz poente pintará com a tinta das copas das olaias floridas. Em baixo, panos azuis de um rio, quási sem água, parado num areal amarelo. Defronte, descendo até o Mondego, a pique, como os penedos das Portas do Rodão, sobre o Tejo, formidáveis rochas estratificadas. Amarelentas e musgosas, o sol da tarde transformá-las-há num colossal «bloco» de ouro esverdinhado. Na campina, fitas de estradas; nos altos, riscos vermelhos – carreirinhos – a subir os montes, por entre penedos e pinheiros de troncos ardosiados; E aqueles moinhos, a um de fundo, como monges de longada (para onde?) na crista da serra, além!


Notas: Excertos do capítulo “Penacova”, páginas 218 a 235; Um ou outro termo foi actualizado graficamente.

Publicidade

Artigo anterior242 municípios portugueses identificaram 67 mil famílias a viverem em condições indignas
Próximo artigoJoão Amaro Martins ganha título de Campeão Nacional de Judo

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui