David Gonçalves de Almeida
No início do segundo quartel do século XVI Portugal estava dividido em seis Comarcas. Eram elas: Entre Douro e Minho, Trás-os-Montes, Beira, Estremadura, Entre-Tejo e Guadiana e, por último, Algarve.
Na época Penacova não pertencia à Beira, mas sim à Estremadura, jurisdição que abrangia 127 vilas, das quais 31 tinham castelo sendo as restantes “vilas-chãs”.
Por Carta Régia, expedida em Coimbra a 17 de Julho de 1527, D. João III (cujo reinado foi de 1521 a 1557), ordenou que cada um dos Corregedores das ditas Comarcas mandasse fazer o arrolamento dos moradores existentes em cada uma daquelas circunscrições. Determinava-se que o escrivão encarregado de fazer o recenseamento fosse a cada uma das “cidades, vilas e lugares” e, num livro especial, “assentasse” o número de habitantes e registar as distâncias e confrontações de cada um dos termos.
De acordo com Costa Lobo (1840-1913) este Recenseamento constitui “um documento de alta valia, não só pela sua enumeração dos habitantes, mas também porque nos dá notícia de muitos factos da vida social” da época.
Na Comarca da Estremadura coube ao Escrivão Jorge Fernandes, fazer o “registo das cidades, vilas e lugares que há em esta comarqua de Estremadura e dos moradores que há em cada hum delles”.
Ora, foi este Jorge Fernandes que no dia 23 de Outubro de 1527 veio à vila de Penacova. Aqui, consultando o “Juiz e o Ouvidor” concluiu que a vila de Penacova tinha 53 vizinhos (no “corpo” da vila), dos quais 2 eram cavaleiros, 18 eram escudeiros, havendo ainda 3 clérigos e 13 viúvas, bem como 17 “pyaes”.
Como salienta João José Alves Dias in “Gentes e Espaços”, um dos principais problemas que se coloca ao historiador demógrafo das Idades Média e Moderna é a definição de fogo e de vizinho. Em ambos os casos, diz este historiador: “representam núcleos familiares, ou sedes de família, ou cabeças de casal; mas, enquanto falar de «fogos» implica, a priori, falar de todos os núcleos familiares de determinado lugar, falar de «vizinhos» implica, ou pode implicar, falar de uma maioria da população da qual estão excluídos, pelo menos, núcleos familiares com menos de quatro anos de residência fixa. Na expressão «vizinho» não parecem entrar ainda, normalmente, nem os clérigos nem os cortesãos.”
É, pois, importante deixar esta nota dado que é precisamente esse termo “vizinho” que, neste Censo que contempla Penacova, o Escrivão usa com frequência, contabilizando, por exemplo, para a vila de Penacova e seu termo um total de 456 vizinhos.
A vila de Penacova (que diz o documento ser de D. Fadrique) tinha “de termo”, para a parte da vila de Óvoa (Comarca da Beira) duas léguas e igual distância para a parte da vila da Lousã (também Comarca da Beira) e para a parte da vila de Pombeiro. Para a cidade de Coimbra e para a vila de Carvalho calculava-se meia légua de termo.
Vejamos agora, o termo de Penacova. Refere o arrolamento de 1527 as seguintes aldeias e respectivos vizinhos:
Ribela (7), Vale do Gonçalo, Carvalhal e Gândara (14), Gondelim (12), “Cousso” (17), Cunhedo e Almassa (12), Oliveira (19 vizinhos e mais 1 clérigo), “A Gieira e Travanca (36), “Silvarinho, Quintela, “Covães” e Venda Nova (11), Paredes, Carvalhal, Lavradio, Laborins, “Beqo”, “Vale da Vila” e Ribeira (33), “Liofreu”, Carvalhal e Mocejo (21), Paradela e Cabeço do Cavaleiro (20), Val Maior e vale do Tronco (27), Vila Nova, Ferradosa, “Esprital” e Riba de Cima (15), “Travaço”, Carvoeira, Falgar, Casais e Ervideira (18), Alveite (12), “Vila Cham, “Vede”, Val do Forno, Val de Vaide, Val de Afonso e Forcado (22), Ferreira, Aldea Nova, Riscasilva e Paço (22), “Conchel” (9), “Peeria do Fundo e Cima” e Pinheiro (31), Vilar, Soutelo, “Crastro” e Terreiros (11).
Verificamos que muitas destas últimas localidades referidas se situam actualmente no concelho de Poiares. Da área que hoje constitui o concelho de Penacova muitas outras localidades são omissas. E que dizer de Lorvão, “Figeira” e “Cazes”? Pertenciam ao termo de Coimbra, não constando, assim, no termo de Penacova. Tinham, respectivamente, 60, 30 e 27 vizinhos. Também Paradela, Farinha Podre não são referidas. Carvalho? Possivelmente por ser um Morgadio… Pensamos que pertenceriam já à Comarca da Beira, a cujo livro o “Arquivo Histórico Português” (que é a fonte principal destes nossos apontamentos de hoje) não teve acesso, por se encontrar à época nos arquivos do British Museum em Londres. Desconhecemos o motivo destas lacunas. Quem sabe, um dia, outros investigadores interessados pelo concelho de Penacova, nos possam vir a esclarecer.
David Gonçalves de Almeida